A entrevista é do site
sexoforte.net e é da autoria de Cátia Viegas
Um timbre de voz inconfundível, uma personalidade forte, sempre rebelde e lutadora continua a desafiar as convenções pré-estabelecidas e a retirar dos momentos menos bons da vida um ensinamento positivo. Simone é a Cantigas de Varela e de um Portugal que a tem, e ainda bem, como exemplo de vida e determinação! Bem-haja!
SexoForte - O que considera realmente único na sua vida?
Simone de Oliveira - O amor definitivo aos meus pais, filhos e netos.
SF - Qual o papel dos homens na sua vida?
SO - É um papel bastante importante. Mas o que nos enriquece a vida são as pessoas por inteiro, na sua integridade absoluta, independentemente de serem homens ou mulheres.
SF - Foi casada com o actor Varela Silva. Pode contar-nos como foi o pedido de casamento?
SO - Essa história é muito bonita… Já Vivíamos juntos há 17 anos. Certo dia fomos almoçar à Costa da Caparica, namoriscámos muito por aquelas bandas, e ele estava ansioso. Notava-se que queria contar-me qualquer coisa, mas não sabia como nem com que palavras, até que lhe perguntei: «Qual é o drama desta vez?». Os amigos chamavam-lhe O Dramas, embora fosse um homem absolutamente extraordinário, era muito taciturno, sério e fechado. A mim chamava-me Cantigas… Mas adiante..., pedi-lhe que me contasse o que se passava e foi, então, que ele começou: «Tu casas comigo, não casas? Já tratei de todos os papéis na conservatória, mas a senhora diz que é preciso a tua assinatura». Eu não pensava nisso, nem tão pouco era minha vontade. Mas, perante aquela declaração, só me ocorreu responder: «Sim».
SF - Foi um momento bonito… Depois de 17 anos de namoro.
SO - Casámos a 7 de Setembro porque ele queria casar com 59 anos e o seu aniversário era no dia 15. E fez tudo muito à séria e com todo o preceito. Mandou chamar um táxi e lá foi para a conservatória. No caminho, o taxista, que o conhecia bem comentou: «Sr. Varela, hoje está muito bem parecido, bem arranjado…». «Vou-me casar», respondeu o meu marido. É claro que o taxista perguntou logo: «Então e a menina Simone? Não me diga que não é com a menina Simone». Chegados à conservatória, o Varela pediu-lhe: «Agora volte a casa para ir buscar a minha mulher». [Risos]
SF - Em nova era uma mulher muito interessante e continua a sê-lo. Como sente o inevitável passar do tempo sendo que, no seu caso, no seu caso não se trata de um envelhecimento…
SO - Lido muito bem com o passar do tempo, talvez porque goste muito de mim como sou. Mudo de cor de cabelo apenas por motivos profissionais. Um dia destes dá-me uma zoina e corto curto. Aceito-me muito bem com a idade que tenho. Gosto de mim como sou. E esforço-me sempre por olhar para o lado positivo da vida, mesmo quando as coisas correm menos bem... Quando a minha mãe morreu, tinha eu 30 anos, foi um momento de profunda tristeza, absolutamente inenarrável, chorei muito e estive muito triste mas sai dali e fui fazer uma comédia. Dois anos depois faleceu o meu pai e fiz o mesmo. Por estes momentos, quando acordo e vejo no espelho as minhas rugas digo de mim para mim: «Sem rugas o que seria da minha alma. As minhas rugas são a minha vida».
SF - A sua cantiga: A Desfolhada. Representando este tema um ícone da libertação da mulher em Portugal. a Simone sente o peso dessa responsabilidade?
SO - Sabe que eu não fui a primeira escolha para cantar A Desfolhada. O José Carlos Ary dos Santos, depois de várias recusas, perguntou-me se me atrevia a cantá-la e disse-lhe que sim. A partir dessa altura criámos um laço de amizade muito, muito forte e eterna. Até hoje. Sinto muito a sua falta, do poeta e do amigo. Quanto ao peso da responsabilidade, sinto que é grande o peso de ser a Verdade e a Força e, às vezes, tenho vontade de ser apenas eu, Simone.
Enquanto entrevistada, Simone dava instruções relativamente a mudanças em sua casa e acautelou: «Cuidado que aí está o vestido da Desfolhada que já tem uns 40 anos e está prometido à minha filha».
Simone de Oliveira é filha de pai belga e mãe portuguesa. Aos 19 anos, foi-lhe aconselhada uma distracção e matriculou-se no Centro de Preparação de Artistas da Emissora Nacional e o futuro ficou-lhe traçado.
Cantou pela primeira vez num Festival RTP da Canção em 1958. Nos dois anos seguintes, aliás, seria a grande vencedora daquele concurso.
São muitas as cantigas que nos levam a Simone de Oliveira e muitos os nomes que a acompanharam deste o tempo do teatro (estreou-se na Revista em 1962).
«Sempre que Lisboa Canta», «Tu», «Nos Teus Olhos Vejo o Céu», são alguns exemplos de êxitos que levaram à conquista do Prémio de Imprensa de 1963, um galardão que recebeu por diversas vezes, incluindo para a categoria de Melhor Cançonetista.
Foi um momento alto na carreira de Simone com vitórias sucessivas e a eleição de Rainha da Rádio. Sucederam-se os discos e os sucessos e nada pára a mulher conhecida como «A Força».
Ao vencer o Festival RTP da Canção, em 1969, conheceu o maior momento da sua carreira. Com letra de José Carlos Ary dos Santos e música de Nuno Nazareth Fernandes, a jovem Cantigas, Simone de Oliveira, abana as vidas portuguesas presas à ditadura quanto interpreta «Desfolhada Portuguesa». Poucos são os dessa época que alguma vez esquecerão a mulher que ousou proclamar: «quem faz um filho fá-lo por gosto».
Durante dois anos perdeu a voz, mas não a força. Jornalismo, rádio, locução de continuidade, apresentação do concurso Miss Portugal e espectáculos no casino da Figueira da Foz permitiram-lhe continuar até recuperar e regressar aos palcos.
Entre muitos momentos altos, destaque para 1977, ano em que foi convidada para participar no espectáculo do Jubileu de Isabel II de Inglaterra. Três anos depois, em Buenos Aires, no Festival da OTI, a orquestra, num gesto único, levantou-se para aplaudir. «À tua espera» recebeu ali o prémio de interpretação.
Comemorou as bodas de prata da sua carreira, com o programa televisivo «Meu Nome é Simone», depois de ter cantado com muitos dos grandes nomes da canção portuguesa e internacional.
Casada com o actor Varela Silva e mãe de dois filhos de um primeiro casamento, a sua impressionante força venceu um cancro de mama, tornando-se numa das imagens de luta contra a doença.
Detentora de uma personalidade irreverente, activista, forte e inabalável nas suas ideias, Simone da Oliveira oferece-se intensamente. Na paixão pela vida é o exemplo.
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